A estruturação de uma equipe voltada especialmente para a elaboração de pleitos é prática comum entre grandes empresas, especialmente as que prestam serviço ao poder público. A necessidade de elaboração destes pleitos pela contratada normalmente nasce da constatação de que esta foi prejudicada, pois o cronograma executivo desviou-se muito do planejado originalmente (ou do último replaneamento). Ou então o custo orçado estoura antes do final do projeto, obrigando a contratada a desviar a verba de contingência (quando há) para cobrir o custo operacional do projeto – ou pior, diminuir o percentual de lucro estimado até mesmo a níveis de “empate” entre faturamento e despesas ou até mesmo prejuízo.
Empresas mais estruturadas já iniciam o projeto com equipe de Administração Contratual (ADC), acompanhando o contrato para defender de situações problemáticas e buscar oportunidades de aumentar o faturamento. Em ambas as situações, a administração contratual normalmente é tida como um departamento à parte do processo rotineiro do contrato, acionado em eventos específicos e com propósitos diretos: ganho ou recuperação financeira ou, em último caso, defesa de penalidades contratuais.
O que acontece nas situações onde a administração contratual é acionada? Sobrecarga aos demais setores, especialmente o planeamento, na elaboração de estudos, documentos, levantamento de informações (mal) registradas e comunicações com o cliente – além de outros documentos que forem julgados pertinentes ao pleito específico. Ou seja, o produto gerado pela rotina de cada setor não é suficiente para comprovar a correta execução do contrato ou para garantir direitos quando estes forem ameaçados ou sonegados na relação contratual pelo contratante. Como citado no artigo do professor Alvaro Camargo em seu blog, disputas entre contratante e contratado só serão resolvidas de forma satisfatória se os fatos e evidências tiverem sido (muito) bem documentados. (Camargo, Alvaro: A burrice nos processos de Administração Contratual.http://alvarocamargo.wordpress.com/2009/12/03/burrice-contratual/).
Infelizmente, na maior parte dos casos, o produto gerado pelos setores responsáveis pela execução do projeto sequer é suficiente para um correto monitoramento da execução do contrato tornando a ADC uma atividade disparada por um gatilho de emergência.
Nova proposta para a ADC
A nova (ou correta) proposta para a Administração Contratual é que ela faça parte dos processos de gerenciamento e monitoramento do contrato, nascendo no Gerenciamento da Integração e sendo um novo e complementar foco nos processos de Planeamento e Controlo. O gerenciamento de mudanças que seria a principal ferramenta da Administração Contratual deve estar perfeitamente integrado a um correto Gerenciamento do Escopo e Gerenciamento do Tempo.
Mas muito mais que isso, a função primária da Administração Contratual deve ser a garantia da correta execução do Contrato, ou seja, uma ferramenta primordial ao gerente do projeto na garantia da execução de todas as cláusulas e normas pertinentes ao projeto. E entenda-se como garantia o monitoramento constante da execução das obrigações contratuais. Pois só cobra quem não deve. E só não deve quem já fez (ou achou alguém que faça).
A ADC começa no completo mapeamento das definições de escopo, direitos e obrigações contratuais. Passa pela divulgação massiva destas informações a todo o time do contrato e fundamenta-se no monitoramento desta execução. Com a criação de checks e holdpoints é possível identificar situações conflitantes, acompanhar o desenrolar das mesmas utilizando ferramentas e informações próprias da execução do projeto e, se houver realmente a necessidade da elaboração de pleito, que este seja o final do processo de controlo e não o início de novos processos. É inadmissível identificar somente no momento da elaboração do pleito que existe uma lacuna de informações em processos não monitorados e resultados não mensurados.
A Administração Contratual deve ser guia já na elaboração da Estrutura Analítica do Projeto (EAP), pois deve antever necessidades adicionais de controlo em pontos críticos do contrato (fornecimento de um equipamento pelo cliente, por exemplo). Assim, eventuais desvios poderão ser facilmente controlados pelos processos rotineiros de gerenciamento, diminuindo a probabilidade de lacunas de informações em momentos de conflito. A indefinição de quais dados devem ser coletados, ou falhas nos processos de aquisição, são danosas e podem acabar com a possibilidade de sucesso de um pleito, até mesmo com a possibilidade de elaboração do mesmo.
Pleito como instrumento da ADC
Este artigo não se propõe a discutir técnicas ou ferramentas de monitoramento do contrato ou estratégias na elaboração de pleitos. Mas trazer luz à visão de que o pleito é uma consequência de um contrato muito bem executado, gerenciado e monitorado. Pleito é um dos frutos da Administração Contratual, não o principal objetivo.
O pleito, apesar de muitas vezes ser justo e de direito, depende de aceitação do cliente. E esta aceitação normalmente é conflitante aos interesses dos stakeholders (prazo e custo).
Tomando como exemplo a nova postura de grandes contratantes do Brasil que adotaram novas práticas de compliance, esta ferramenta como forma de equalização do equilíbrio do contrato ficará de uso cada vez mais restrito.
Isto significa que o uso da reivindicação de prazo e custo, mais do que nunca, deverá ser feito com grande embasamento, fruto de um processo de controlo muito mais abrangente e eficaz do que o praticado pela maioria das empresas atualmente no mercado de construção e montagem.
Como um pleito é objeto de discussão entre cliente e contratado, parte-se do princípio de idoneidade e lisura na relação comercial. Mesmo assim, a correta interpretação e aceitação do pleito dependem de cláusulas contratuais com definições claras em relação a desvios de prazo e custo. Infelizmente esta clareza contratual não é presente na maior parte dos contratos. Pode-se ainda adotar critérios e orientação, como os indicados pela Society of Construction Law (SCL) em seu Delay and Disruption Protocol (Society of Construction Law. Delay and Disruption Protocol. Disponível em http://www.eotprotocol.com/). Este documento é um excelente guia sobre a condução do contrato, desde a aquisição de registros até os critérios de definição de pleito e sua análise. Mesmo assim, o sucesso do pleito dependerá da aceitação do cliente. E nos piores casos da intervenção de terceiros como árbitros ou até mesmo a justiça.
Executando um gerenciamento não só eficaz, mas eficiente, muitos pleitos podem ser evitados e terem suas situações de origem identificadas quando ainda podem ser tratadas como eventos futuros, antes de impactarem no tripé prazo x qualidade x custo e serem administradas sem maiores desgastes, no gerenciamento de mudanças.